sexta-feira, 20 de agosto de 2010

Já volto

Tenho um aniversário este fim-de-semana no Rio de Janeiro. Volto no domingo.

Ah, o aniversariante e anfitrião é ele:

segunda-feira, 2 de agosto de 2010

Tira-zica

Era sexta-feira. O dia de trabalho tinha terminado e as esplanadas estavam cheias de gente que, de copo na mão, davam já as boas vindas ao fim-de-semana. Um rapaz, com uma sacola cheia, aproximou-se da minha mesa e mostrou a todos o que tinha para vender. Sabonetes de todas as cores e formas. Mas aqueles eram especiais, explicou ele. Sabonetes artesanais "tira-zica". Traduzindo: sabonetes com poderes especiais contra a má sorte. Ninguém estava interessado nos produtos do moço e fizemos um gesto meio desinteressado com a mão. A verdade é que, mesmo assim, ele tirou um em forma de coração e ofereceu-me. Para tirar a zica, disse ele.
No dia seguinte, combinei um final de tarde com uma amiga e ela estava muito em baixo por causa do namorado. As coisas estavam negras por causa da distância e a pobre coitada de rastos. Tirei o meu sabonete em forma de coração da mala e ofereci-lho. Se alguém precisava de afastar a zica nos domínios do amor era ela. Deu-me um abraço e disse-me que ia para casa tomar um banho com o meu presente. Não parou de o usar desde então.
O namorado dela chega esta semana a São Paulo. Percebeu que não valia a pena zangarem-se e fez o que deve ser feito: comprou uma viagem e vem matar saudades.
Amanhã faço plantão à porta do bar daquela sexta-feira e encho a mala de sabonetes. Adeus zica!

quinta-feira, 29 de julho de 2010

O fim-de-semana da liberdade

A vantagem de vir para uma cidade com mais portugueses é que, fora do trabalho, nos primeiros tempos, quando ainda não conhecemos ninguém, nunca estamos sozinhos.
Ainda em Portugal, disseram-me que teria de arranjar vários programas e aproveitar para viajar bastante porque "ninguém fica em São Paulo ao fim-de-semana". É mentira! Talvez por estarmos no inverno e não haver demasiado calor, dois dias por semana não chegam para tudo aquilo que gostava de fazer fora do estágio. A cidade tem feirinhas de artesanato por todo o lado, há locais obrigatórios para experimentar sucos, pastéis, empanadas, sushi, guiozas, feijoada, churrasco, pizza, caldo de feijão, brigadeiros... e são muitos. Há a Óscar Freire, com as suas lojas caríssimas e lindas, a 25 de Março, cheia de contrabando e onde se encontra tudo, mas mesmo tudo, a preços muito apetecíveis, a Benedito Calixto e as suas antiguidades, com telefones de disco de todas as cores, bobines e claquetesde cinema, a Liberdade, onde podemos sair de São Paulo e entrar no Japão, apenas a uma estação de metro de distância do centro da cidade.

Por aqui, o fim-de-semana começa logo à sexta-feira por volta das 17:30. É dia de Happy-Hour! Toda a gente sai mais cedo do escritório em direcção ao boteco mais próximo para beber cervejas e descontrair depois de uma semana de trabalho. E, no meu caso, as ordens vêm de cima. Ainda não era 17:30 e um dos directores já nos estava a chamar para baixo. Foi o primeiro a chegar à esplanada e a guardar mesa para todos. Depois de algumas caipirinhas de frutas e umas coxinhas de frango, o director mostra o porquê do cargo que ocupa. Veio uma cachaça de pimenta para a mesa e, depois de ter passado pelos lábios de todos e ninguém ter coragem sequer para dar um gole, o Sr. Director vira o copo de shot sem sequer pestanejar. Mais tarde, veio outro copo para a mesa e vai de shot outra vez. Ficou ali provado porque é que é ele o director.
O Happy-Hour acabou às 3h da manhã em Vila Madalena e é claro que no sábado chibatei-me 20 vezes por ter acordado depois das 13h e não ter aproveitado nada da manhã.

Como sempre por aqui, para a noite já havia muitos planos: uma peça de teatro (que ainda bem que não fui porque um dos actores desmaiou em palco e o espectáculo foi cancelado), jantar com os portugas nas gordurosas sandes de pernil do Estadão, que já se tornou um clássico, e o muito aguardado concerto do Tom Zé no Comitê.
O concerto foi muito bom, o lugar maravilhoso e a companhia não podia ser melhor.

Domingo foi dia de mergulhar no Japão. Combinei com o Pedro, o meu colega de estágio, ir almoçar à Liberdade. Por lá, juntámo-nos ao Jorge (Inov) e à namorada, que tinham trazido a Fernanda, uma amiga de Rio Grande do Sul.
Comemos sushi até cair, comprámos espetadas de morangos banhados com chocolate numa banca da rua, provámos sumo de gengibre, bolos de feijão... regateámos preços de depiladoras e máquinas de barbear, pusemos tiras de papel coloridas penduradas em árvores com os nossos desejos, vimos um concerto de uma banda de metal japonesa, que só toca os genéricos dos animé (a música do Pokemon foi o auge), vimos a actuação de dança de uma tribo urbana de miúdos que se vestem como os animé... andámos, andámos, cheirámos os vapores dos wooks espalhados por toda a parte, passámos por centenas de japoneses que só sabem falar brasileiro e nunca pisaram o Japão na vida.

No final do dia, antes de irmos para casa, saímos da confusão da Liberdade e fomos beber uma cerveja à Augusta (a rua dos bares e dos restaurantes, que já nos conquistou aqui em São Paulo).
Numa mesa com 5 portugueses, uma brasileira e uma espanhola, o Jorge levantou o copo e num brinde encerrou a maravilhosa tarde de domingo: "à liberdade!".

segunda-feira, 26 de julho de 2010

No inverno sabe bem...

No domingo à tarde, sentada no metro, olhei para um dos anúncios institucionais, de utilidade pública, que recheiam as carruagens, que dizia assim: "No inverno sabe bem... comer uma sopa." Tive de olhar para mim própria para confirmar o cenário: óculos escuros na mão, top de alças, umas sabrinas bem leves nos pés e um casaco de malha enrolado dentro da mala. Os senhores que mandam na meteorologia em Portugal deviam pôr os olhos no trabalho que os seus semelhantes fazem aqui por estes lados.

segunda-feira, 19 de julho de 2010

A Dona Marlene

A Dona Marlene tem muito frio, conduz devagar, estranha quando a sopa não leva carne, fala durante horas ao telefone e não larga a internet, acha que São Paulo é uma cidade muito perigosa, vê telenovelas e repete muitas vezes a mesma expressão: “Qui gozado, né?”

A Dona Marlene foi a primeira pessoa que conheci em São Paulo. Na noite em que cheguei, abriu-me a porta (sempre trancada à chave) da sua casa, mas não conseguiu descansar. Quando me apanhou fora do quarto, nessa mesma noite, pediu-me os meus documentos, os meus contactos em Portugal e garantiu-me, fazendo-me acreditar que era uma necessidade minha, que no dia seguinte iríamos ao banco, levantar o dinheiro para o primeiro mês de renda.

A Dona Marlene levou-me ao supermercado, apresentou-me os pastéis de carne e todas as frutas das bancadas. Falou-me de feiras de frutas e legumes ao fim-de-semana, falou-me da Pinacoteca, da casa das empanadas de Vila Madalena e explicou-me o funcionamento do micro-ondas.

A Dona Marlene é judia e gosta de cinema. Na minha primeira noite em São Paulo, levou-me à mostra de cinema “israelense” e ficou indignada por o filme não fazer juz aos homens machos e viris de Telavive, mas apresentar um taxista sensível e meigo, pouco habituado aos altos e baixos do amor. A Dona Marlene já esteve em Israel e sabe do que fala.

A Dona Marlene tem quase 70 anos e “vai na academia” duas vezes por semana, não gosta de detergente líquido para a roupa, sai várias vezes com as amigas e diz que os gays são o terceiro sexo. A Dona Marlene tem um sobrinho gay muito bonito.

A Dona Marlene é muito querida e quer que todos se sintam bem na sua casa. A casa da Dona Marlene é para todos, mas eu não sou para a casa da Dona Marlene. Amanhã começo a procurar uma nova morada.

quarta-feira, 14 de julho de 2010

São Paulo à chegada

Lisboa ficou para trás e nem ousei olhar pela janela quando o avião descolou, rumo ao céu azul.
Hoje acordei com trovões e muita chuva a bater na janela. O sol de São Paulo não quis brilhar neste meu primeiro dia. Talvez esteja tímido, talvez seja cauteloso, talvez me queira fazer sofrer um bocadinho. As coisas boas não podem ser mostradas logo ao início porque depois já nada nos consegue surpreender.
A cidade não tem uma cara bonita, daquelas que nos prendem de imediato. É dura para quem chega habituada ao glamour e meiguice das cidades europeias. Ainda mais com este tempo cinzento...
Mas hoje foi o dia zero. Amanhã vou aventurar-me sozinha por aí, vou vestir o casaco e sair para a rua debaixo do meu guarda-chuva florido. E principalmente, vou ter sempre comigo as palavras que um dia escreveu Fernando Pessoa:

"Há um tempo em que é preciso abandonar as roupas usadas, que já têm a forma do nosso corpo, e esquecer os nossos caminhos, que nos levam sempre aos mesmo lugares. É o tempo da travessia: e, se não ousarmos fazê-lo, teremos ficado, para sempre, à margem de nós mesmos."

Hoje, começou uma vida nova.